Toda a noite tentara, em vão, ter a sua atenção e, pelo contrário, assistiu ao exercício de um alucinante fascínio sobre todos os presentes. Tinha-a ainda chamado de parte, procurando “conversar” enquanto ela lhe atirava com um discurso assanhado e irónico, evitando sempre o seu corpo nu.
Só daqui saio quando acabar de beber a minha cerveja! Podeis todos ir onde quiserdes que eu daqui não arredo. Tá-se aqui tão bem... – recostou-se na cadeira e deu três grandes goladas na garrafa.
Todos se aglomeravam já próximo da saída, quando ele se aninhou junto dela pedindo-lhe que os acompanhasse - Ninguém vai aqui ficar...
Também não te quero aqui, só preciso da companhia desta cerveja, vai. A música tá boa, a bebida melhor ainda, que mais quero eu? Vai!... – repetiu olhando-o nos olhos, transbordando sedução. Tê-lo aninhado junto de si fazia-a sentir-se irresistível e senhora da situação. Na verdade, não era só impressão sua. Ele sentia-se de facto enlouquecer. Agora, era somente seu aquele olhar. E foi este o início do fim.
Todos saíram e o jogo começou. Ela estava com níveis elevados de confiança. Nele, explodia o desejo. Concentrando sobre uma só vítima a sua sedução, ela tentava agora apanhar-lhe incoerências no discurso. Queria provar a si mesma que ele era só mais um. Precisava alimentar a tão velha mágoa, mantê-la viva.
Sentou-o no sofá, apertou-o entre as pernas, abraçou-lhe o pescoço, aproximou os lábios entreabertos ao ouvido e, no tom mais provocador e sensual que conseguiu articular: Ofende-me... Num sorriso quase chorado, ele respondeu que nunca o poderia fazer. Apertando o seu corpo contra o dele, exerceu pressão e continuou como uma flauta: Ofende-me, por favor!
Não tens respeito pelo teu corpo – começou, a medo.
Essa não vale, não ofende – retorquiu como uma criança.
És uma rica putinha – arriscou.
Essa não ofende porque não é verdade.
Tá bem, só estou a fazer um esforço... – disse ele com o amuo de quem é forçado a fazer o que não quer.
De repente o vento mudou. Ele começou num desvario. Estava decidido a ofendê-la, se não com palavras, então com actos.
Houve um instante em que, desequilibrados, caíram. Ele deitou-a contra o chão e imobilizou-lhe os braços e as pernas. Tocou-a como nunca o fizera antes. Apertou-lhe, como em tenazes, ossos e músculos. Magoou-a. Ela tentou debater-se e ainda gritou. Ele continuou a demonstração de força. Apesar da dor, ela percebeu o carinho que dormia em tão bruta acção. Decidiu parar de se debater.
Ouviu-se uma forte pancada vinda do quarto. Parou tudo. Olharam-se. Ela perguntou indignada: ainda cá está gente? Ele, embriagado, lembrou-se que dois amigos tinham ficado ali com a intenção de dormirem. Ela resfolegou, levantou-se e foi embora, ofendida.

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